Dois dos maiores especialistas de carreira do Brasil lançam um livro em que dão dicas para profissionais que vão liderar pessoas pela primeira vez na vida.
No Brasil, há pouquíssimas pessoas tão gabaritadas para falar de carreira, liderança e, principalmente, de responsabilidade e ética de executivos quanto a dupla Luiz Carlos Cabrera e Luiz Edmundo Rosa. Um dos headhunters mais respeitados do país, Cabrera é sócio-fundador da Amrop-Panelli Motta Cabrera e professor da Fundação Getulio Vargas em São Paulo.
Luiz Edmundo foi executivo de RH da Odebrecht e do Banco Nacional e, após mais de uma década na Accor, mudou-se no ano passado para o grupo educacional Anima, onde é vice-presidente de desenvolvimento humano e sustentabilidade. Luiz Edmundo também é diretorgeral do Congresso Nacional de Recursos Humanos (Conarh). A dupla se juntou para escrever um livro de dicas dirigido ao profissional que assume pela primeira vez o cargo de gestor e precisa aprender a lidar com pessoas: Se eu fosse você, o que eu faria como gestor de pessoas - Editora Campus/Elsevier
Um detalhe: mesmo com todo esse currículo, antes de escrever o livro, resolveram reunir um grupo de novos gestores para ouvir o que eles tinham a dizer. “Tínhamos o receio de estar um pouco distantes desse público”, diz Cabrera. Como primeira lição, fi ca aí a humildade. As demais você lê na entrevista a seguir.
O que esses encontros com jovens gestores revelaram para vocês?
LUIZ CABRERA: Apareceram coisas novas para nós. Nos surpreendeu o preconceito. Por exemplo, um jovem nos disse que antes de se tornar gestor era um sujeito que sempre chegava sorridente ao trabalho e que ao assumir o cargo de chefe precisava fazer uma cara fechada. Outro dizia que não podia ter as mesmas conversas que tinha com amigos de trabalho porque havia virado gestor. Eles querem saber qual deve ser seu novo comportamento.
LUIZ EDMUNDO ROSA: A passagem do profi ssional ao cargo de gestor é muito descuidada por todos os lados. Pela empresa, que deveria ser a maior responsável por isso, pela escola, que não prepara a pessoa para assumir esse papel. As pessoas são jogadas.
Por que a chegada ao cargo de gestor é um momento tão marcante na carreira?
CABRERA: É nesse momento que o profi ssional se diferencia pela primeira vez. Se diferencia por ter sido escolhido, por ter subordinados, por ser responsável por resultados. A partir desse ponto começa uma nova carreira como gestor.
Quais são as principais dúvidas que surgem na cabeça do novo gestor?
CABRERA: Uma delas é a importância e o signifi cado de formar alianças e parcerias com chefes, pares e equipe. Existe um ranço de que, ao assumir um cargo de gestor, você sabe tudo. O profi ssional fi ca morrendo de medo de não saber responder à primeira pergunta que fi zerem a ele. E nós dizemos no livro que é ele quem deve fazer as perguntas. O processo de quem assume a função de gestor é um processo de perguntar, não de ter as respostas. Essa obrigação de saber tudo vem de um tempo em que os acontecimentos no trabalho se repetiam. Hoje, parte das coisas se repete, mas outra parte é inédita. Você não tem a obrigação de saber. Mas tem a obrigação de perguntar.
LUIZ EDMUNDO: O profi ssional precisa perguntar muito porque o maior risco que ele corre é trabalhar com pressupostos. Ele pressupõe o que o chefe quer dele sem que ele discuta, pressupõe o que a equipe espera dele sem que ele negocie e pressupõe o que os pares acham dele sem que ele se esforce para descobrir. A gente propõe um roteiro de perguntas que o profi ssional precisa fazer para o chefe antes de assumir o cargo. A primeira delas, que muita gente não faz, é: “Por que você me escolheu?”. Você tem que entender as expectativas do chefe.
Quais são os erros mais comuns que os novos gestores cometem?
LUIZ EDMUNDO: Eles falham ao não estabelecer quando vão ocorrer os momentos de diálogo com o chefe. Quando o gestor não faz isso, as coisas vão aparecendo no dia a dia de forma esporádica.
CABRERA: Criar essa agenda de relacionamento com o chefe é um dever do profi ssional. Ele não deve esperar que o chefe faça isso. Ele deve sair da inércia de achar que o chefe sabe o que faz. O profi ssional não pode fi car esperando que o conhecimento da gestão esteja instalado na empresa.
LUIZ EDMUNDO: Na hora que o sujeito vira gestor, ele não pode deixar de incluir na negociação a vida pessoal e a remuneração. Parece óbvio, mas muita gente deixa de falar nessas coisas. E aí fica sem saber se o chefe acha bom que ele faça um MBA ou não. Fica sem saber quando receberá um aumento. Nossa sugestão é que ele faça perguntas abertas. Por exemplo: “O que mudará na minha remuneração?”. Aí o chefe vai dar uma explicação. Isso é estabelecer um relacionamento profi ssional.
Será que um profissional recém-empossado no cargo de gestor tem esse poder de barganha com o chefe e a organização?
CABRERA: A gente sugere que o profi ssional vá montando sua infl uência. Antes de conversar com o chefe, vá costurando com os pares, com a equipe. Aí quando você chega para falar com o chefe, já traz o alinhamento de todos. Quer dizer, o profi ssional vai procurando no coletivo uma força para sustentar suas colocações.
LUIZ EDMUNDO: O gestor não pode ser inocente. Ele não pode fi car inibido de fazer perguntas por achar que não vai agradar. Ele não pode achar que tocar no assunto remuneração é indelicado. No fundo, quem não dá valor a si mesmo não vai ter valor.
Como o gestor adquire maturidade?
LUIZ EDMUNDO: Uma boa dica é a seguinte: o fato de ter sido promovido a gestor não quer dizer que a pessoa conquistou essa posição. Há um período de iniciação em que ele tem de ser aceito pelos próprios pares, além da própria equipe. Ele precisa se preparar para passar por essa fase.
Como o profissional se prepara para essa transição?
LUIZ EDMUNDO: Ele deve ser ele mesmo. Ser franco, objetivo, não empobrecer as relações. Como fazer isso? Se preparando para os contatos com as outras pessoas. Para ir a uma reunião, tem de estudar antes, planejar o que dizer. É preciso fazer com que os poucos momentos de contato sejam ricos. Isso não ocorre necessariamente com espontaneidade, exige preparação.
O que muda na relação com a empresa?
CABRERA: A partir do momento em que se torna gestor, o profissional precisa entender o negócio. Antes de ser promovido, isso não é necessário. Mas, como gestor, ele precisa saber bem os objetivos para ser capaz de dizer para a equipe o que é preciso fazer.
LUIZ EDMUNDO: Nesse ponto, o novo gestor precisa aprender também que, pela primeira vez, ele terá de separar fatos de opi niões para decidir. Ele precisa aprender a ouvir os diversos lados envolvidos e entender o que é fato e o que é mera opinião. A partir daí, ele deve decidir em cima de fatos.
"O gestor não pode trabalhar com pressupostos. Ele tem de entender o que esperam dele"Luiz Edmundo Rosa
Revista Você S.A. - Edição 0135
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