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segunda-feira, 7 de setembro de 2009

As novas redes da Amazônia

Com o dedo no teclado e uma conexão (bem) ruim, os blogueiros do Norte são protagonistas da mais nova saga da integração amazônica.

ELIANE BRUM
 Reprodução

Desbravador da blogosfera

Fábio Malini, professor e blogueiro, coordena a pesquisa Cartografia da blogosfera brasileira. Na foto, ele está na sala de aula da Universidade

Eles venceram onde projetos de sucessivos governos fracassaram ao longo da história do Brasil. Sem sair de casa, com um computador e uma conexão de internet tão ruim que é conhecida por “ciponet” ou “interlerda”, homens e mulheres de idades variadas vêm conseguindo integrar a Amazônia às demais regiões do Brasil – e ao mundo. Um número cada vez maior de blogueiros tem usado a rede para contar histórias de uma terra que, pela distância, muitas vezes só virava notícia quando era tarde demais. Denunciam desmatamentos, filosofam sobre o cotidiano, fazem literatura, discutem religião, aproximam geografias. Ao botar uma lupa sobre seu quintal, tornam-se cidadãos do mundo. Sua ação transforma o modo de olhar para a Amazônia – e também a forma como a Amazônia olha para as muitas partes de si mesma.

Numa pesquisa inédita, Cartografia da blogosfera no Brasil, Fábio Malini, professor da Universidade Federal do Espírito Santo, mostra que essa conquista da Amazônia é recente. Sua equipe analisou 300 blogs em quatro capitais: Belém, no Pará, Manaus, no Amazonas, Rio Branco, no Acre, e Macapá, no Amapá. Promoveu ainda encontros em Porto Velho, Rondônia, e Boa Vista, Roraima. Concluiu que quase 90% dos blogueiros da Região Norte fincaram sua bandeira entre 2007 e 2009. Possivelmente devido às dificuldades de acesso: segundo dados do Comitê Gestor da Internet no Brasil, até 2008 apenas 7% da população do Norte tinha acesso à internet em casa, em comparação a 25% no Sudeste.

O blog foi o primeiro gênero de expressão nascido na internet – e não adaptado para ela. Ele tem o espírito libertário da rede, onde qualquer um pode se manifestar. Os blogs ampliaram a diversidade de olhares sobre o mundo e contribuíram para disseminar informações nos regimes mais fechados. Sua força foi provada em países autoritários, como Cuba e Irã, quando blogueiros foram decisivos para furar o bloqueio da comunicação.

É verdade que não dá para confiar em tudo o que os blogs publicam. Há blogueiros que tentam substituir a atividade de jornalistas sem assumir os deveres correspondentes. Tanto no que se refere à apuração e checagem rigorosa das informações, quanto à responsabilidade por publicá-las. Também é fato que a própria rede tem elementos que podem ajudar a resolver esse problema. Construir reputação e credibilidade na blogosfera é uma tarefa árdua. Quando um blog deixa de ser linkado e comentado por não ter compromisso com a verdade, é um tipo de morte. Se esse mecanismo bastará para garantir a ética na internet, é algo ainda incerto. Mas é impossível, hoje, falar em comunicação sem levar em conta os blogueiros – e em nenhum lugar do país isso é tão claro quanto na Amazônia.

Lá, eles assumiram o papel de divulgar informações e pontos de vista que até então não circulavam nem dentro da região, menos ainda fora. Realizaram a façanha de romper a barreira geográfica. Com a consultoria de Malini, ÉPOCA escolheu quatro blogs. Feitos à imagem e semelhança de seus criadores, cada um conta um capítulo da nova saga da integração da Amazônia.



A DEVEDORA DO SARNEY

 Reprodução
Alcinéa Cavalcante
Endereço do blog: www.alcinea.com
A blogueira enfrenta uma das piores conexões do país para levar as notícias do Amapá ao restante do Brasil. Por sua atuação na campanha de 2006, foi processada mais de 20 vezes por José Sarney
















Alcinéa Cavalcante tem um automóvel Ka 2003, um laptop, uma linha telefônica convencional, um celular, algumas dezenas de livros de poesia, roseiras de cores variadas, dois cachorros vira-latas que não param de latir e uma mangueira na casa que herdou, mas ainda não está em seu nome. A cada ano, ela recebe uma notificação da Justiça que deixaria a maioria dos brasileiros com dor de estômago, suor frio, tremedeira. É a dívida de Alcinéa com o presidente do Senado, José Sarney (PMDB): segundo ela, mais de R$ 2 milhões, com juros e multas. E aumentando.

Explica-se: na eleição de 2006, quando Sarney se reelegeu senador pelo Amapá com menos folga que nas anteriores, ele processou a blogueira mais de 20 vezes. Sarney considerou abusivos posts e comentários de leitores. Num deles, enviado a ÉPOCA pelo advogado de Sarney, um leitor dizia: “Temos de mandar esse xibungo pro Maranhão, somente assim faremos justiça àquela população pilhada há anos por uma família de jagunços que se utilizam dos métodos mais desprezíveis para combater qualquer um que cruze o caminho desses viciados em corrupção”.

Alcinéa conta que ficou bem nervosa nas primeiras notificações. Não tinha advogado nem sabia o que fazer. Nos dias seguintes, passou a receber até três notificações de cada vez, e o oficial de Justiça já tomava cafezinho na casa dela. Alcinéa entregou a Deus. “Se eu devesse R$ 10, 12 mil, não dormiria, porque é um valor que, parcelando, dá para pagar”, diz ela. “Mas mais de R$ 2 milhões?”

Aos 53 anos, ela é a matriarca da blogosfera do Amapá, reverenciada pelos mais jovens nos encontros ao vivo dos “blogueiros do Meio do Mundo”, na cafeteria Tom Marrom. É a dona ainda do “quintal mais bem informado de Macapá”. Pelo seu portão passa uma romaria de gente, da cultura à política. Não é Alcinéa quem vai até suas fontes, mas suas fontes que vão a ela. Debaixo de uma mangueira, ela recebe informações e bloga. Só vai à rua em busca da notícia quando pressente – ou é informada por uma fonte fiel – que a Polícia Federal se prepara para uma operação. Alcinéa passa noites inteiras de campana, para pegar a PF em flagrante. Quando consegue, o blog chega a 3 mil leitores por dia.

Alcinéa só reduz a produção do blog uma vez por ano, no Carnaval – ela adora um ziriguidum, um telecoteco. Filha de um poeta que fez história em Macapá, Alcy Araújo, e de uma professora, Alcinéa escreveu a primeira poesia aos 10 anos. Tornou-se repórter de rádio aos 13. Trabalhou em rádio, TV e jornal por quase toda a vida, mas formou-se mesmo em mecânica. Dividiu as manchetes na imprensa com o ensino sobre motores de avião, carros e navios. É funcionária federal há 31 anos, 15 deles em sala de aula. Afirma não ter partido. “Fui filiada ao PT, depois me desfiliei”, diz. “Às vezes, dou R$ 50 ao PSTU.”

Quando leu um artigo sobre a internet, no início dos anos 90, Alcinéa e o único filho não sossegaram até acessar a rede por um portal de São Paulo. Pagavam interurbano. Iniciou sua aventura no mundo virtual, onde chegou a manter uma agência de notícias. Na eleição de 2004, criou o blog. E começou a mudar a relação de forças no Amapá. “A imprensa daqui depende muito dos recursos públicos, não denuncia nada que contrarie os interesses de quem está no poder”, diz. “Os blogs furam esse bloqueio. E as notícias vão para o mundo.”

O blog de Alcinéa costuma ter brincadeiras interativas com o leitor. Em agosto de 2006, com o título de “O adesivo perfeito”, a proposta era a seguinte: “Mande fazer um adesivo com a seguinte frase: ‘O carro que mais combina comigo é o camburão da polícia’. E bote na picape daquele candidato”. Os leitores responderam com os candidatos mais variados. Um deles manifestou-se dizendo que era “um adesivo perfeito para o Sarney”. No dia seguinte, Sarney entrou com uma ação pedindo indenização e a retirada do blog do ar. Alcinéa não recuou. Postou no blog a foto de um muro da cidade, onde estava pichado “Xô, Sarney!”. Mais uma ação.

Os blogs políticos deverão crescer na Amazônia,
estimulados pelas eleições de 2010

O advogado de Sarney, Fernando Aurélio de Azevedo Aquino, é funcionário do Senado desde 1992 e hoje ocupa um posto de “assistente técnico” no gabinete do senador Gilvam Borges (PMDB), afilhado político de Sarney. Procurado por ÉPOCA, Aquino afirmou que “estava de férias” quando foi advogado da Coligação União pelo Amapá, pela qual concorria Sarney. “Não obstante a senhora Alcinéa busque apresentar-se como vítima, é preciso dizer que não foi”, disse Aquino, por escrito. “Não se tratava de representações contra a divulgação de matéria ou mesmo de opinião, mas contra publicação de agressões gratuitas e até de baixo calão.” Procurado por ÉPOCA, Sarney afirmou, por meio de sua assessoria, que considerava as respostas enviadas por Aquino satisfatórias.

O UOL, que hospedava o blog de Alcinéa, tirou-o do ar. Assim como foi retirado o blog de sua irmã, Alcilene Cavalcante. Alcinéa hospedou-se então no Blogger, a ferramenta de blogs do Google. Ao contrário de sites como o UOL, o Google não se responsabiliza – e não pode ser responsabilizado legalmente – pelo conteúdo dos blogs que abriga.

Alcinéa continuou postando. E Sarney processando. Quando ela colocou no ar a letra da canção de Chico Buarque, “Apesar de você”, Sarney processou. Ela colocou então a música em notas de violão. Depois de ter vencido a eleição, Sarney ainda processou Alcinéa mais uma vez. “Todo mundo sempre disse sim ao Sarney, e de repente alguém disse não. Ele não está acostumado a ser peitado”, diz Alcinéa.

A blogosfera reagiu ao que considerou “censura” e “abuso de poder”. A expressão “xozando”, derivada do Xô, Sarney, tornou-se popular. Mais de 50 mil blogs e sites “xozaram” no Brasil e fora dele. Em sua pesquisa, Malini detectou que o episódio Sarney deixou uma marca na blogosfera do Amapá. “Os blogueiros vivem um processo de autocensura, os posts se tornaram mais velados”, diz. Na França, Alcinéa ganhou o prêmio Repórteres Sem Fronteiras, pelo blog brasileiro que mais defende a liberdade de expressão.

Em menos de dois meses, ela recebeu mais de 20 notificações da Justiça. No Tribunal Regional Eleitoral do Amapá, Alcinéa perdeu a maioria delas. Depois, diz ela, seu advogado perdeu prazos nos recursos. “Por causa de matérias que fiz como jornalista, um pistoleiro já foi contratado para me matar, já dispararam tiro contra a minha casa. Mas o que o Sarney fez comigo é mais indefensável”, diz Alcinéa. “Muitas portas se fecharam, e meu filho não consegue emprego.” Na época, Alcinéa postou: “Recadinho para os velhos ranzinzas e ditadores: enquanto vocês gastam seus dias procurando motivos para me processar, eu uso meus dias para ser feliz”.

Quando se conhece Alcinéa ao vivo, a afirmação parece bem perto da verdade. Ela tem tantos amigos e o quintal é tão frequentado que dá vontade de raptá-la para a entrevista. Sua tensão só é exibida ao fumar um cigarro atrás do outro. Alcinéa tem jeito manso e se ilumina toda quando sorri. No fundo de seus olhos, porém, mora um brilho de gente boa de briga. “Eu achava que só aqui no Amapá tinham medo do Sarney”, diz. “Descobri nessa crise do Senado que metade do Congresso é patife e a outra metade é frouxa. Um por cento deve dar para respeitar.” Fotografa uma rosa do jardim e oferece aos leitores virtuais. Mais tarde vai ao templo da Igreja Messiânica Mundial do Brasil para rezar: “Peço a Deus que descongele o coração do Sarney”.


O BLOGUEIRO MAIS RÁPIDO DO OESTE

 Reprodução

Altino Machado
Endereço do blog: altino.blogspot.com
A jiboia mora no telhado da casa do blogueiro mais influente do Acre. Ela gosta de engolir sapos – ele não engole nenhum. Altino escreve sobre política, meio ambiente e temas sociais
























Você conhece o Altino Machado? A pergunta provoca um olhar enviesado. “Todo mundo conhece. Com ele não tem meio-termo. Ou o amam, ou o odeiam.” E você, ama ou odeia? “Nem um nem outro.” Fiz essas duas perguntas a dez pessoas, dos centros culturais ao mercado de Rio Branco, antes de entrevistar o blogueiro mais influente do Acre. As respostas se repetiram, com uma ou outra palavra diferente. Do resultado, é possível inferir cinco conclusões: 1) Altino é conhecido por diferentes camadas da população; 2) é polêmico, porque ninguém fica indiferente; 3) é temido, porque quem o odeia prefere não dizer; 4) é solitário, porque quem o ama opta por não se comprometer; 5) é “arrochado”, sinônimo local para corajoso, já que as quatro deduções anteriores tornam a vida, na capital do Estado de Chico Mendes (1944-1988), um ato cotidiano de resistência.

Altino marcou a entrevista para as 6 horas da manhã. Suspirei, mas não discuti. Isso deveria significar alguma coisa. Significava. Ele está empenhado numa guerra contra o novo horário do Acre, instituído por iniciativa do senador Tião Viana (PT). Altino queria que a jornalista não fosse apenas informada, mas vivesse o drama da população ao caminhar numa cidade escura. O Acre costumava ter diferença de duas horas com relação a Brasília. Em junho de 2008, a diferença foi reduzida para uma hora, em tese para o Estado ficar mais perto do Brasil. Desde então, muita gente vai ao trabalho, à escola ou à casa de Altino numa escuridão tão densa que dá para vestir.

“A casa fica em frente à igreja do Daime”, informo ao taxista. Não é uma coincidência. Altino faz parte da comunidade do Centro de Iluminação Cristã Luz Universal – Alto Santo, criada pelo fundador da doutrina, Raimundo Irineu Serra (1892-1971). Foi ele quem batizou como “daime” a ayahuasca, bebida ritual de origem indígena. Altino toma o daime desde os 20 anos. Tem hoje 46.

O motorista roda e roda até algo muito próximo a uma zona rural. Então se perde. Altino surge como um espectro entroncado no meio do breu. Sou conduzida para dentro de uma casa acolhedora, onde finalmente alcanço o real significado de um café da manhã tropical. Mingau de banana, tapioca, castanha in natura, bacuri...

À luz da cozinha ampla, é possível investigar o jornalista que tantos temem no Acre. Traços retos, resultado da mistura de índios, negros, portugueses e espanhóis. Físico forte, cara de mau. Com quem gosta e respeita, tão doce quanto o creme de cupuaçu que vai servir de sobremesa no almoço, depois de um tambaqui recheado e assado na brasa. Quem assistiu à minissérie Amazônia – de Galvez a Chico Mendes (Globo) já o conhece. Ele fez o papel dele mesmo, Altino, contracenando com Lima Duarte. A ponta foi uma homenagem da autora, Glória Perez, por sua atuação na cobertura da luta de Chico Mendes. Dezenove dias antes de ser morto, Chico Mendes denunciava, em matéria assinada por Altino, no jornal O Estado de S. Paulo, que planejavam assassiná-lo. “Só depois que morreu na primeira página do The New York Times é que a imprensa brasileira correu para acompanhar seu enterro em Xapuri”, diz Altino, ácido como um camu-camu.

No passado, sua casa foi alvejada por tiros, e três vezes foi retirado às pressas do Acre. Numa delas, porque denunciou que o então governador, Orleir Cameli, tinha quatro CPFs. Depois de viver em São Paulo, Brasília e Goiânia, em diferentes períodos, voltou ao Acre. Trabalhou para a comunicação do ex-governador Jorge Viana (PT). Não deu certo. Tornou-se blogueiro em 2004. “Fiz o blog para não morrer”, diz. E, só desta vez, o “morrer” é simbólico. “Se não fosse o blog, eu cairia no ostracismo, já que a imprensa daqui é dominada pela politicalha local”, afirma.

Tornou-se um líder da blogosfera amazônica: centenas de blogueiros se inspiram nele e outras centenas sonham em ser linkados em seus posts. Seu blog é um exemplo do gênero que tem crescido muito no Norte desde 2008: o político. O aumento, segundo a Cartografia da blogosfera brasileira, se deveu às eleições municipais. “Os blogs tornaram-se a ferramenta de expressão de uma vontade política adormecida”, diz Malini. Antes da internet, o único meio de comunicação era uma imprensa dependente da publicidade estatal para sobreviver. O crescimento dos blogs políticos é motivado por uma demanda reprimida de expressão.

Segundo Malini, eles deverão crescer e multiplicar-se na eleição de 2010. “No Norte, especialmente se Marina Silva for candidata a presidente”, diz. “Haverá uma ativação da rede social, tanto para afirmá-la como para criticá-la. E o selo de blog amazônico ganhará uma força maior, porque a Amazônia estará na pauta.”

Com média de 1.200 acessos por dia, o blog de Altino alcança Estados do país onde os jornais do Acre pouco repercutem. Seus posts ecoam pela região, pautam a mídia nacional e são linkados pela blogosfera política. Questões que antes ficavam confinadas ao Acre, pelo isolamento geográfico, agora ganham o mundo em tempo real, mudando as relações de força e a dinâmica do acesso à informação. “Antes, o governo fazia o que queria, estávamos longe. A internet rompeu com isso”, diz Altino.

Em 46% dos blogs há conteúdo de diário, em 38% jornalístico,
em 32% literário e em 27% entretenimento

A senadora Marina Silva (PV) acompanha o blog de Altino pelo briefing de sua assessoria. “A Amazônia tem uma necessidade cada vez maior de reflexão independente, e os blogs têm proporcionado um trânsito maior e mais diversificado de informação”, diz Marina. “O Altino é uma fonte cada vez mais relevante dentro e fora da região. Quando eu era ministra do Meio Ambiente, em momentos de tensionamento, como nas usinas do Rio Madeira, existia uma falta de informação muito grande sobre como realmente aconteciam aqueles processos. Ele abordava a questão de uma forma que favorecia a sustentabilidade. Foi bem importante.”

Altino faz parte da geração dos anos 80, que gerou no Acre políticos como Marina, o ex-governador Jorge Viana (PT) e o atual, Binho Marques (PT). “Ele sempre foi fora dos padrões, nunca se enquadrou no formato dos jornais e das estruturas institucionais. O blog se identifica muito com ele, na medida em que não tem patrão”, diz Jorge Viana. “Os blogs mudaram o processo de comunicação, e acredito que vão crescer muito ainda.” Viana reconhece que Altino provoca polarizações de amor e ódio em algumas pessoas. “Mas não sinto nem um nem outro. Tenho com ele uma relação de profundo respeito.”

Embora o Acre não seja mais aquele Estado onde o deputado Hildebrando Pascoal obrigou um jornalista a engolir a página da matéria que escrevera, Altino continua a viver perigosamente. A prova mora 1 metro acima de sua cabeça, no telhado da varanda onde ele bloga. Só é possível ver um pedaço do rabo e a cabeça da jiboia que mora entre duas telhas. A cobra e o jornalista não chegam a ser amigos, mas cultivam uma relação de respeito mútuo. Complementam-se: ela gosta de engolir sapos. E também ratos, insetos e até parentes menos corpulentos. Ele faz o possível para não engolir nada, nem um mísero desaforo. A cobra não é peçonhenta. Altino, se provocado, pode ser muito viperino. Especialmente com políticos corruptos.

A jiboia aponta uma cabeça tímida quando Altino conta sobre um de seus mais recentes desafetos, o ministro Gilmar Mendes. Em março, numa coletiva de imprensa no Acre, o presidente do Supremo Tribunal Federal achou a pergunta do jornalista abusada. Altino perguntou: “Ministro, o senhor tem se manifestado em defesa da propriedade, contra as invasões, mas em nenhum momento se manifestou contra dezenas, centenas de assassinatos de lideranças de trabalhadores rurais. Isso decorre do fato de o senhor ser ministro ou pecuarista?”. Mendes respondeu: “Eu tenho me manifestado contra qualquer violação de direitos. Eu não quero que haja assassinatos, violência. Pode-se protestar, fazer qualquer consideração, mas tem de ser respeitado o direito de outrem. A pergunta é desrespeitosa. O senhor tome cuidado ao fazer esse tipo de pergunta. Eu não sou pecuarista.” O diálogo, reproduzido no blog de Altino, ecoou. A blogosfera política do país referiu-se à resposta do ministro com palavras como “truculência” e “censura”. Procurado por alguns blogueiros famosos, Altino preferiu não levar a briga adiante.

Quando vai para a rua, munido de gravador e câmera, Altino pega um mototáxi. Não tem carro. Segundo ele, nem dinheiro para pagar a Previdência. Em 10 de março de 2007, encontrou a geladeira vazia. Postou no blog um pedido de doações. Em alguns dias, os leitores depositaram perto de R$ 6 mil. E ele pôde continuar postando críticas e denúncias, algumas contra a administração de seu antigo colega de teatro infantil, o governador Binho Marques.

Aos 6 anos, Altino costumava esconder o rádio debaixo do colchão de capim para sintonizar a BBC de Londres ou uma emissora de Cuba. Naqueles dias, queria ser engenheiro eletrônico para descobrir de onde vinham as notícias. Só bem mais tarde percebeu que apenas como repórter poderia tocar naquela mágica. O blog o trouxe de volta ao rádio, ao ser picado pelo mosquito da instantaneidade. “Não consigo mais deixar a notícia para amanhã. Tenho de dar já”, diz. “Agora sou mundial.”

Ouve-se o canto do uirapuru. É o celular de Altino tocando. Não para mais. É gente querendo colocar um post sobre um evento. Ele desconversa. Um político às voltas com uma denúncia queixa-se da armação de colegas do governo. Ele ouve. Para leitor que reclama, ele mostra sua face mais encantadora. “Não gostou, procura outro. O blog é meu, faço o que eu quero”, diz. E depois, num raro sorriso: “Ah, isso não tem preço”.


QUATRO LISOS X O VILÃO DA FALTA DE GRANA

 Reprodução
Diego, Vinicius, Danilo e Sérgio
Endereço do blog: 100grana.wordpress.com
Os quatro criaram um blog que se tornou referência no mundo da cultura pop. Escrevem sobre cinema, quadrinhos e televisão para quem gosta, mas nem sempre tem dinheiro para consumir




























Era um momento glorioso na vida dos quatro lisos. Depois de muito suor, muito peito, muito xaveco, muita falta de grana, eles conseguiram. Havia um representante deles lá, infiltrado entre os grandes da imprensa. Na “sala de justiça”, de fato um anexo da casa da mãe de dois de nossos super-heróis, os quatro lisos choravam, ainda que jurem: “Só por dentro”. Toda uma vida, e eles chegaram a metros dos bíceps e tríceps e quadríceps de seu grande ídolo. Sim, ele, Rambo, Rocky, Sylvester Stallone. Enquanto o enviado especial dos lisos fazia perguntas a Sly, os quatro – Vinicius, Danilo, Sérgio e Diego – gritavam: “Égua!”.

“Égua” é uma expressão curinga no Pará. Quando muito feliz, égua. Muito infeliz, égua também. Muito qualquer coisa, égua. Só “égua” podia expressar o êxtase de participar da coletiva de imprensa do novo filme de Stallone, Os mercenários, e anunciar: “Eu sou do 100grana, um blog de Belém do Pará”. “Para nós, é tão emocionante como se o homem tivesse chegado à Lua”, diz Diego Andrade, de 26 anos, jornalista.

Explica-se. Diego não acredita que o homem tenha chegado à Lua. Não ainda. Além de cultura pop, ele e os outros três lisos investigam teorias conspiratórias. No “100grana investiga”, já houve grandes momentos, do tipo: “Por que todos os personagens de Disney usam luvas brancas?”.

“Lisos” é outra expressão popular em Belém. “Liso não é o pobre, miserável. É uma pessoa como nós, que teve acesso à leitura, a filmes, se criou numa boa Sessão da tarde”, diz Diego. “Tem essa sede por consumir cultura pop, mas nem sempre tem acesso financeiro.” Ou, como resume Vinicius Passos, de 27 anos, idealizador do blog: “Liso pode ser o cara tipo eu, que tem dois filhos, investe o salário da agência de publicidade na casa e na família e, só se sobrar, pode investir em cultura pop”.

Tudo explicado, aconteceu assim: eles eram três lisos que amavam Superman, Chaves e Gato Félix, quando, em novembro de 2006, botaram no ar o 100grana.wordpress.com – cultura pop para lisos. Depois chegou o quarto, Diego, com quem Sérgio havia esbarrado na Caverna, a loja de quadrinhos mais famosa de Belém. Os quatro – com ajuda de colaboradores intrépidos – tornaram o 100grana uma referência na blogosfera pop: 10 mil acessos por dia, acima de 300 mil por mês, 5,5 milhões até hoje. E o número não para de crescer. Diego saca o celular e mostra a mensagem gravada para a posteridade às 16h05 de 31/5/2007: “Senhores, dentro de alguns minutos chegaremos a 30 mil”. Quando chegou a mil em um dia, Danilo Passos jurou correr pelado pelas ruas de Belém. Não cumpriu. Aos 24 anos, formado em multimídia, Danilo é um detetive digital. Acha qualquer coisa na internet.

A maioria dos leitores – ou melhor, lisos – é do Sudeste. Mas no mapa do blog há nerds por todo o planeta. Alguns se surpreendem: “Vocês são de Belém mesmo?”. São. Os rapazes do 100grana revelam outra dimensão da vida numa capital amazônica. Seu cotidiano não tem tribos indígenas, grilagem de terra e sucuris. São garotos de classe média, urbanos, vivendo num mundo pop, ligados mais ao que acontece nos estúdios de Hollywood que nos grotões do Pará. “Nosso público espera uma opinião, não um repasse”, diz Diego. “Trabalhamos com fontes que atuam diretamente no que acontece nos Estados Unidos. Algumas vezes damos notícias em primeira mão.”

Os quatro comem waffle servido pela mãe de Vinicius e Danilo. Às vezes se entusiasmam e falam todos ao mesmo tempo. Sérgio Fiore ouve tudo, mas parece perdido em alguma dimensão interna. Ele sente-se um pouco Peter Parker, o fotógrafo comum e sempre 100grana que pode virar o Homem-Aranha a qualquer ameaça. “No universo paralelo, eu faço grandes coisas”, diz. “Mas, para as pessoas que não conhecem o site, sou aquele cara sem emprego.”

Aos 26 anos, Sérgio é formado em artes visuais. Vive de trabalhos freelances. No universo paralelo da internet, é autor da mais criativa seção do blog, a Bonecópolis. Nela, cria tirinhas de histórias de super-heróis s customizados. Sem dinheiro para aumentar sua coleção, descobriu que poderia melhorar muito os brinquedos baratos que comprava nos camelôs. “Por que vou gastar dinheiro num boneco do Star Wars que custa quase R$ 50? Compro uma cartela com quatro a R$ 20 e faço algo muito melhor”, diz. Esse é o espírito do 100grana.

Pesquisa revela que 46% dos blogs amazônicos
produzem notícias próprias

O trunfo do blog é a personalidade dos quatro. Eles são bem-humorados, mas sérios. Não há traços de cinismo. Essa é a marca de sua atuação na internet. E do evento anual que organizam em Belém, o TrashBack. “A gente não tem medo de falar mal de nada, até de coisas que a gente idolatra”, diz Diego. “Mas temos respeito, porque são coisas que estão na história de todo mundo.”

As sessões do TrashBack, exibidas num cinema de verdade, para que o revival seja completo, têm essa mistura de nostalgia com humor. Para quem não tem intimidade com o culto ao trash, é mais ou menos o seguinte: aqueles programas, séries, filmes que são tão ruins, mas tão ruins, que chegam a ser bons. Tipo: o Espectreman está lutando e aparece um zíper em suas costas. Nas duas primeiras edições, o quarteto fantástico do 100grana exibiu preciosidades, como o episódio do seriado Elo perdido (1974) em que a família conhece o Cha-ka. Para quem teve o desgosto de perder essa série na infância, trata-se de uma família que atravessou um portal do tempo e desembarcou num universo povoado por dinossauros. Cha-ka, um mix de gente e macaco, ajuda os recém-chegados a entender o novo mundo.

Outro ponto alto foi um filme sobre O quarteto fantástico, produzido em 1994. Tão ruim que não chegou aos cinemas. Nele, o Homem-Elástico dá um adeuzinho e lança um braço de pano. Sem contar a versão turca do Guerra nas estrelas. Para o próximo TrashBack, ainda sem data marcada, eles só revelam uma atração: vão apresentar um episódio do McGyver (1985).

Em grandes eventos do mundo pop, como Rambo IV e Batman – O cavaleiro das trevas, ambos de 2008, consomem madrugadas e sanduíches para preparar especiais para o blog. “Sempre colocamos os filmes em seus contextos sociopolíticos, para mostrar que eles não são apenas um roteiro cheio de tiros”, diz Diego. O material de Rambo e de Batman é primoroso, como é possível conferir no blog. “Como competir com os sites que têm acesso aos sets?”, diz Diego. “Com conteúdo.”

Antes dos grandes lançamentos, os quatro lisos montam trailers comentados para colocar na rede. Neles, explicam cada referência. Nas estreias, ocupam os cinemas de câmera na mão para registrar a expectativa do público ainda na fila – e depois, na saída. “A gente não gosta de futebol”, diz Vinicius. “Então, para nós, um lançamento desses é como uma Copa do Mundo. Mas ficamos atentos. Se a gente não tiver um olho muito crítico, vira apenas um replicador.”

Os quatro lisos encontraram sua identidade secreta numa cidade bem longe dos grandes centros de produção da cultura pop. Ainda sofrem quando tiram a roupa de super-herói num mundo em que os cidadãos comuns nem sempre compreendem que blogar é trabalho duro. O preconceito é sua criptonita. Mas sempre há um universo paralelo para voltar. Nele, salvam diariamente o mundo dos popmaníacos – até mesmo no Japão.


O ESTRANGEIRO

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Teo Victor
Endereço do blog: bichoderondonia.com
Ele é um dos blogueiros mais originais da Amazônia. Escreve longos ensaios religiosos e textos de ficção. Em capítulos, sem fotos. Não se preocupa com números, só com credibilidade




























Teo Victor delineou a geografia fluida de seu corpo na internet. Desde o primeiro dia na escola, quando chegou atrasado e 20 colegas cravaram os olhos nele e começaram a cochichar, ele conta não ter se reconciliado mais com seu corpo. Filho de migrantes mineiros que atenderam ao chamado do governo militar para ocupar a Amazônia, nos anos 70, seu cenário era uma cidade nova nos confins de uma floresta que deixou de ser, povoada por outros migrantes que arrancaram as árvores nativas para semear as de sua terra natal ao redor de casas com cheiro de madeira recém- -tombada. Teo era frágil num mundo que cobrava a superação de limites físicos para sobreviver. Sentia-se estranho a ambas as geografias – a da terra e a da carne. Era um desterrado nascido no desterro. Só alguém que sentia a dor do mundo em um corpo sem fronteiras demarcadas poderia ter uma consciência tão lúcida de sua condição. Teo levou sua falta de pertencimento a limites radicais. Tornou-se um típico homem amazônico deste século ao conter em si todos os seus não territórios.

“Sempre me senti estrangeiro. Não sei o que é sentir diferente disso”, diz ele. “A internet é o mais próximo de uma casa que cheguei. E, por muito tempo, ela foi mais real para mim que o mundo de fora.” Sem suportar o que chama de lentidão da escola, solitário em todos os recreios, Teo só sabia que existia quando escrevia. Tratado como estranho àquele mundo, leu Dostoiévski, Victor Hugo, Tolkien, Chesterton, C.S. Lewis e Kierkegaard. Em 1999, botou um pé anônimo na rede e entabulou suas primeiras conversas em chats. “Você é mesmo de Rondônia? Aí tem internet?”, perguntavam amigos virtuais para os quais Rondônia era mais distante que Nova York. “Tem até energia elétrica”, respondia ele.

Aos 19 anos, em 2006, ele criou seu blog, Um bicho de Rondônia. Nele, não há fotos suas. O retrato desta reportagem é o primeiro rosto que Teo expõe publicamente. “Também não gosto de espelhos”, diz. “Sempre que passo por um, tenho um sobressalto.” Teo, que tem dificuldade em reconhecer seu corpo, conhece bem a matéria de que são feitas as palavras. “Eu adoro linguagens”, diz. Conta que aprendeu sozinho a ler inglês, grego clássico, hebraico e japonês. Estudar é o que faz pelas madrugadas de insônia, depois de passar o dia trabalhando na informática do serviço público. Vive agora em Porto Velho, num apartamento de escassos móveis e luz.

Assim se apresenta no blog: “Teo Victor, rondoniense por nascimento, domicílio e falta de opção, trabalha profissionalmente com informática, por falta de opção, desde 2003, embora ache que isso não é digno de nota. (...) Após uma luta contra sua timidez literária, inaugurou o blog Bicho de Rondônia em 2006. Desde então, passou a escrever sistematicamente, não apenas em respostas a postagens de fóruns. Cheio de si e de espinhas, foi encontrado por Cristo alguns meses após o mundo não ter acabado em janeiro de 2000, o que permite que veja um sentido definido nas coisas”.

Ao ter sido “encontrado” por Cristo, Teo encontrou outro jeito de estar no mundo, especialmente o virtual. Ele é um dos artífices de uma comunidade intrigante, a Blogosfera Cristã. O espaço agrega 500 blogs. Nele, blogueiros do Brasil e de outros países debatem questões que nem sempre encontram abrigo nas denominações religiosas. Muitos não têm Igreja, como Teo. São cristãos sem território religioso delimitado, gente que não se reconhece no mundo fechado das instituições. Outros são ligados a denominações e frequentam missas e cultos, mas comungam de muitas críticas. A própria rede se constitui num templo ecumênico que os une num debate religioso corajoso e de bom nível.

A última blogagem coletiva da Blogosfera Cristã é prova disso: “Uma só carne, múltiplas opiniões/sexualidade e igreja”. Nela, questões como masturbação e virgindade foram discutidas com franqueza. “Os católicos têm críticas à moral rígida de sua igreja, em temas como sexo antes do casamento e o uso de preservativos”, diz Teo. “Já os evangélicos têm problemas com a mediocridade artística. A música é ruim, os livros são ruins, sem contar o mercantilismo da fé.”

Em seu blog, Teo alterna literatura com ensaios religiosos. São textos longos, sem fotos nem ilustrações, que se estendem por capítulos. Numa análise sobre Satanás, demostra a escassa aparição de Belzebu na Bíblia e desfaz folclores. Para abordar os temas religiosos, Teo soma uma leitura inteligente da Bíblia a um conhecimento que se estende da filosofia ao universo pop. É isso que o torna tão interessante. Um trecho: “Apontar Satanás como o lado mau da humanidade não se alinha ao que é mostrado em Jó, já que teríamos de admitir que o lado mau de Jó compareceu diante de Deus, prestou testemunho contra si próprio, pediu autorização para acabar com a própria vida, matou seus filhos, servos e animais, destruiu sua propriedade, contaminou seu corpo com uma doença e se feriu propositalmente. Teríamos de entender Jó como uma pessoa esquizofrênica, com arroubos de Darth Vader, psicopata e masoquista”.

O ensaio sobre o capeta dividiu os dias e a atenção dos leitores com um romance de suspense, com inspiração autobiográfica. Um trecho do primeiro capítulo: “Para mim, era apenas uma manhã ordinária após uma noite de sonhos comuns que já tinha esquecido. (...) Tudo era exatamente como é hoje. As mesmas coisas ainda estão aqui, e quase todas as manhãs se parecem com aquela. Talvez seja isso que me leve a esperar constantemente dias com o mesmo desenrolar daquele”.

Teo tem 23 anos. Em 2006, conheceu Dâmaris pela internet. Cristã como ele, também avessa a fotografias. Depois de sete meses, ela o convenceu de que havia algo que se perdia entre eles ao não se conhecerem na realidade dos corpos. Teo viajou para Fortaleza para encontrá-la. Foi assim que ele começou a olhar para este mundo com menos estranhamento. E, agora, gosta ao menos de seu cabelo, cada vez mais longo. Nas alianças mandou gravar em hebraico as palavras “para sempre seu”. Casaram-se em janeiro. Hoje, ela divide com ele o pequeno apartamento e o computador.

Teo não conhece nenhum blogueiro de Rondônia. No mundo virtual, segue sem fronteiras. Teo Victor, esse garoto estranho de sensibilidade extrema, é um cidadão do mundo. E faz pensar. O que seria dele, nos confins de Rondônia, sem a internet? E o que o mundo perderia sem que Teo e os tantos como ele não tivessem nem como nem onde se expressar? Gente como o bicho de Rondônia faz a biodiversidade da Amazônia ficar mais rica.

Fonte: http://revistaepoca.globo.com

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